Eu estava com a determinação de um Cristiano Ronaldo em hora de golo, mas a minha mãe tinha ar de quem acabara de levar uma facada no coração. A minha avó, no alto dos seus 75 anos, continuava sem perceber como é que eu estava a fazer as malas se o convite para o casamento ainda não lhe tinha chegado às mãos.
Era março de 2016 e entrei em casa com a novidade do ano: ia viver sozinha. Nem sequer tinha visto um catálogo de eletrodomésticos, muito menos sabia quanto custava um sofá-cama ou uma mesa para a televisão. Tudo haveria de se resolver, afinal, o contrato, esse já estava assinado em duplicado.
Encontrei por acaso um modesto apartamento na Praça do Brasil e soube desde logo que aquela ia ser a minha mansão. Um T1 remodelado com vista para o Vitória só por si já se torna “Enorme”. Ainda para mais quando a isso se junta um quarto e um terraço espaçoso que dá para o cão.
Tudo parecia perfeito e eu senti que era amor. Assumi o compromisso assim que me disseram o preço: 280€ por mês e não se fala mais em negociação.
É verdade, verdadinha e juro que não estou a sonhar. Vivi durante um ano e meio num apartamento em Setúbal com todas as comodidades por apenas esse valor, sem nunca me ter sido cobrado mais um tostão.
Entretanto, os anos passaram e houve uma revolução. Todos os dias vejo o desespero das pessoas por não encontrarem um teto para criarem a sua mansão — e não é que não os haja, mas custam um dinheirão.
Setúbal está na moda e quem cá vive está a pagar caro de mais sem ter ganho a lotaria. Há apartamentos com dois quartos com rendas superiores a um ordenado mínimo e mesmo assim não se pode levar o cão.
Há quem peça 900€ e três meses adiantados só para fechar um contrato de uma casa que não tem portão. Nem varanda, janelas grandes, duas casa de banho ou um sótão.
Vamos lá ter calma, senhores doutores, que as modas passam e Setúbal é de quem a desenhou. E de quem todos os dias continua o esboço da cidade mais perfeita à beira-mar plantada.