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“Uma Janela para um País Livre”: o mais recente mural da cidade foi pintado por 25 pessoas

A obra integrada na campanha, “Painting for Palestine”, está na Avenida da Portela. Demorou dez horas a ser pintada.
Já pode conhecer a nova obra.

São as grandes causas que unem as pessoas, de diferentes partes do mundo, etnias e religiões, em torno de um objetivo comum. “Uma Janela para um País Livre” é o nome do mural que nasceu na cidade este domingo, 28 de janeiro, na Avenida da Portela, junto ao terminal intermodal. A obra foi pintada no âmbito da campanha internacional, “Painting for Palestine”, que contou com a participação de 25 pessoas.

Tal como a NiS noticiou, o projeto surgiu na sequência do último conflito entre Israel e a Palestina, iniciado a 7 de outubro de 2023. “Uma Janela para um País Livre” teve por base a obra de Azhar Al Majed, artista da Palestina. Em Setúbal, decorre no âmbito da iniciativa “Histórias que as Paredes Contam”, que está também a desenvolver várias atividades relacionadas com a celebração dos 50 anos do 25 de Abril. O desafio de associação à campanha, que arrancou a 14 de janeiro, em Belfast, na Irlanda do Norte, foi lançado pelo sociólogo irlandês Bill Rolston. Além de promover o fim da opressão da Palestina e proclamar a paz, tem como objetivo divulgar obras de artistas palestinianos.

Professor catedrático da Universidade do Ulster e especialista em muralismo político-social, Bill Rolston diz sentir-se honrado por estar “numa cidade com uma grande história de luta”, confessando o seu “especial prazer em ver uma ligação entre Setúbal e Belfast”, de onde é natural. “Em ambas as cidades, estamos a pintar murais de solidariedade com o povo da Palestina. Em Setúbal, o mural refere-se aos sonhos de liberdade, enquanto em Belfast estamos a mostrar parte do horror atual em Gaza”, esclarece, depois de ver a obra na Avenida da Portela.

Helena de Sousa Freitas, coordenadora do “Histórias que as Paredes Contam”, acrescenta que a execução do mural “reuniu na mesma parede pessoas com as mais variadas idades, áreas de formação e sensibilidades artísticas, sendo que algumas delas só se conheceram nesse dia”. Apesar das mais de duas dezenas de pessoas presentes, há que destacar cinco artistas visuais, “que se distribuíram por tarefas como criar o esboço para transpor a obra de Azhar Al Majed para a parede, preparar as cores exatas a usar, desenhar os contornos da imagem e fazer os acabamentos”.

“Foi com enorme gosto e de coração cheio que aceitei o convite para participar na campanha ‘Painting for Palestine’. A arte é uma forma forte de luta, de ativismo e de passar uma mensagem de solidariedade para a Palestina e o mundo”, declara Lala Berekai, artista e ativista que participou na conceção do mural, desde o primeiro momento, e principal responsável pela obra. “Mostrar a nossa necessidade e o nosso dever de dar esperança, força e resistência ao povo Palestiniano, até à sua libertação, e mostrar que nós, como comunidade, em Setúbal, Portugal, estaremos sempre solidários pela causa”, foi outros dos motivos que a levou a participar.

Lala Berekai a pintar o mural.

Paula Moita foi outra artista que se identificou, desde logo, com a mensagem da iniciativa e com todo o projeto. “Para mim, é sempre uma honra quando posso ser veículo para elevar o sentir de alguém ou, neste caso, de um povo, que vê a sua voz abafada. É importante que saibam que não estão sozinhos nesta luta”, explica, sobre o trabalho que consumiu um total de dez horas de trabalho ao conjunto de participantes.

Já Maria Teresa Matos deixa vincadas as suas motivações. “Como artista plástica autodidata, participei nesta iniciativa para apelar à paz na Palestina, à retirada do exército israelita, pela desanexação dos territórios ocupados indevidamente pelos israelitas, pela aprovação da criação de um estado palestiniano e pela autodeterminação do povo palestiniano. A arte é uma forma de contestação e de intervenção política e social”, defende.

Com um discurso semelhante, a estudante de Artes Visuais, Matilde Pinto, considera “impossível fazer arte sem significado”, a acrescentar ao facto de ser “defensora dos direitos humanos”. “A luta contra o colonialismo e o genocídio não pode terminar nas stories do Instagram quando há meios para ir mais além”. A jovem diz ainda esperar que Azhar Al Majed se reveja no mural agora pintado e que, “no futuro, possa pintar um mural da sua autoria no país que é seu por direito”. A artista plástica Rita Melo, cujo trabalho prévio ao arranque da pintura facilitou a transposição da obra de Azhar Al Majed para a parede, entende que “passar uma mensagem de paz é sempre extremamente importante”, já que é “um privilégio poder contribuir, junto com outras pessoas, para a concretização deste mural”.

A sua interpretação do mural é partilhada por Helena de Sousa Freitas, que acompanhou o processo e documentou os trabalhos. “Cada pessoa, participante na criação do mural ou simples espectadora do mesmo, fará a sua leitura sobre a obra, mas eu entendo-a como um apelo ao fim dos conflitos e à paz, não apenas entre Israel e a Palestina, mas num sentido universal”, sublinha a coordenadora do projeto, para quem “a paz é um bem tão necessário à vida dos povos como o pão, a habitação, a saúde e a educação, para parafrasear Sérgio Godinho”.

A quinta e última sessão do ciclo de conversas, promovido pelo projeto “Histórias que as Paredes Contam”, irá decorrer a 30 de janeiro, às 18h30, no Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal. Intitula-se “Dos Troubles ao Brexit — a expressão muralística na Irlanda do Norte”, dia em que decorrem 52 anos desde o Domingo Sangrento em Derry, e terá como convidado o sociólogo irlandês. O moderador do evento será Luís Humberto Teixeira.

Com uma longa carreira de obras publicadas, incluindo um levantamento fotográfico exaustivo que documenta a evolução dos muralismo político-social nas paredes norte-irlandesas desde 1981, o investigador irlandês esteve em Portugal, em 1978, altura em que inúmeras pinturas davam vida a fachadas e muros. Agora, está de regresso ao nosso País, no ano em que se celebra o 50.º aniversário do 25 de Abril.

A conversa será encerrada com um momento musical a cargo do convidado, que fará a sua interpretação da canção de intervenção irlandesa “Your Daughters and Your Sons”, um original de Tom Sands. Com chancela do Monte de Letras e integrado no Programa das Comemorações Nacionais dos 50 anos do 25 de Abril, “Histórias que as Paredes Contam” deve o nome à tese de doutoramento de Helena de Sousa Freitas, que coordena o projeto.

Além do ciclo de conversas e do álbum sobre o muralismo, a iniciativa inclui a execução de um conjunto de novos murais, a organização de duas mostras fotográficas e a realização de um documentário sobre o processo criativo destas atividades. O projeto tem como parceiros a Câmara Municipal de Setúbal, através da iniciativa “Venham Mais Vinte e Cincos”, o Instituto Politécnico de Setúbal, a Associação dos Municípios da Região de Setúbal, juntas de freguesia do concelho, a União Setubalense e a Associação Cultural Festroia.

A seguir carregue na galeria para ver imagens, cedidas por Helena de Sousa Freitas, de alguns murais pintados em Setúbal entre os anos 1990 e 2000.

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