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O casal russo que fugiu da guerra e abriu um spot com mais de 80 cervejas artesanais

O Capt.Tap, de Mariia e Artyom, fica na Baixa de Setúbal. Há também waffle de batata-doce com cerveja na receita, claro.
Difícil vai ser escolher.

Foi um jantar de casamento e, ao mesmo tempo, um momento de despedida. Mariia Kostrikina e Artyom Shlaev, ambos com 34 anos, casaram-se em agosto de 2022, seis meses depois de ter começado a guerra com a Ucrânia. A lua de mel foi o pretexto ideal para o casal russo partir numa viagem de nove dias, que começava a 3 de setembro do mesmo ano. O objetivo era mudarem-se da Rússia para Portugal. 

Na noite de 2 de setembro do ano passado despediram-se da família, sem saberem quando se voltariam a encontrar. Eram 6 da manhã quando começaram a viagem com tudo o que tinham, incluindo o cão, Chendler, e o gato, Kia. Venderam o apartamento, que ainda está intacto, em agosto de 2022, assim como todo o recheio da casa.

Quando chegaram à fronteira da Rússia, foram abordados e totalmente revistados, mas disseram que iam viajar numa espécie de escapadinha de casamento e conseguiram atravessar porque acreditaram na sua justificação. Já na fronteira da Estónia, não foram precisas grandes explicações. A viagem durou nove dias e decorreu sem acidentes nem percalços. 

Chegaram a Portugal a 12 de setembro de 2022. A primeira paragem foi na Figueira da Foz e quiseram, desde logo, conhecer o nosso País. O objetivo não era passear pelas localidades de uma perspetiva turística, mas como cidadãos que queriam começar uma vida e um negócio.

Um amigo do casal já lhes tinha falado de Setúbal. Quando visitaram a cidade do Sado, em outubro do mesmo ano, apaixonaram-se pelo local e não tiveram dúvidas que seria aqui que iriam viver. “Não é demasiado grande, nem muito pequena. O que mais gostamos, além das pessoas, do rio e da natureza, é o facto das distâncias entre os sítios serem curtas e podermos andar a pé”, contam à New in Setúbal.

O casal conheceu-se em 2009, através de amigos em comum, e ambos são naturais da Sibéria, uma região da Rússia. Em 2010, começaram a viver juntos, em Kemerovo. Em 2016, partiram para São Petersburgo à procura de uma vida melhor. Mariia já trabalhava desde 2014 num restaurante de sushi, “Sushi-Terra”, e passou depois para subchefe em 2015, no “People’s”, onde fazia grelhados.

Quando chegou a São Petersburgo, trabalhou no restaurante “Trappist”, mas em 2017 apercebeu-se que queria algo mais e passou a trabalhar no ramo imobiliário, primeiro na Trend (2017/2018), depois Cian (2018/2020) e, por fim, em 2020, começou na Mir Kvartirm, onde se manteve até deixar a Rússia.

Arytom trabalhou em vários restaurantes como engenheiro de som, na Sibéria. Quando chegou a São Petersburgo, em 2016, começou a trabalhar como vendedor de carros na empresa Rolf e por lá ficou até tomarem a decisão de se mudarem para Portugal.

“Havia muitas razões. A liberdade de expressão estava comprometida. Não podíamos falar contra o governo, até antes da guerra da Ucrânia. Se disséssemos algo ou escrevêssemos a nossa opinião, podíamos ter a sorte de ser a primeira vez e levar um avisou ou, se fosse a segunda, ser condenados a sete anos de prisão”, revela Mariia.

Assim, a primeira razão para saírem da Rússia foi mesmo a questão da segurança. Portugal está entre os seis países mais seguros do mundo, ao contrário dos territórios russos e ucranianos. O presidente Vladimir Putin foi outro dos motivos.

“Percebemos que ele não vai a lado nenhum e que, para viver na Rússia, tínhamos de estar preparados para qualquer coisa. Não quisemos viver assim e não nos sentíamos seguros. Os crimes que acontecem em Portugal, de vez em quando, acontecem duas vezes por dia na Rússia, em bairros diferentes”, explica Mariia.

Quando era seguro, protestavam contra o governo e foi difícil destacar um momento que fosse diferente dos outros porque fugir da polícia era constante. “Ainda antes da guerra com a Ucrânia, as autoridades já usavam uma força excessiva”, afirma Mariia, embora nunca tenha presenciado nenhum momento mais tenso ou violento.

Foi com o começo da guerra que Mariia e Artyom encontraram o último motivo que faltava para deixarem o seu país. A família de ambos está a salvo. Além dos restantes familiares e dos pais, Mariia tem uma irmã mais velha, de 46 anos, Helena, e um irmão de 37, Aleksey. Arytom é filho único. Mantém o contacto diário através de videochamadas. Apesar das saudades, são felizes e estão “seguros” em Portugal. 

A adaptação a Portugal e a abertura do Capt.Tap na Baixa de Setúbal

Porém, a adaptação ao nosso País não foi fácil. Os cheiros, a cultura, as tradições, era tudo diferente. O primeiro passo foi tratar da legalização que, segundo o casal, demorou algum tempo, uma vez que neste momento “ser russo é considerado tóxico”. Ainda assim, confessam não ter sentido nenhum tipo de xenofobia por parte dos portugueses.

O grande desafio estava mesmo em perceber como é a vida em Portugal e o que é que faltava em Setúbal. “Queríamos um espaço onde se  pudesse beber uma cerveja com os amigos tranquilamente e conversar”, afirmam. Nunca pensaram que Portugal tivesse tanta variedade de cerveja e o caminho foi mesmo esse. Abriram, em junho, o Capt.Tap Beer Bar, onde pode comer um petisco e provar uma grande diversidade de cerveja artesanal. Ao todo, são mais de 80 diferentes de todos os cantos do mundo e de Portugal.

A verdade é que desde que criaram a conta de Instagram, chegavam mensagens todos os dias de marcas muito distintas. Há várias marcas de outros países, mas mais de 50 por cento das cervejas são nacionais. Umas chegam do interior alentejano, outras do Norte, perto de Coimbra, sem esquecer a Ophiussa, a cerveja de Setúbal, conhecida a nível internacional.

“A nossa missão é mostrar que Portugal não é só vinho, mas tem também uma indústria de cerveja enorme e muito diversificada”, diz a proprietária do negócio. Há ainda Kombucha e vários tipos de cidra. 

Além da cerveja de garrafa, há cervejas artesanais à pressão — que podem mudar. Encontra a Trema (3,50€), a Weekend (4,50€), a Matiné (4€) e a finistera (4€), todas da marca Dois Corvos. Há também a Schneider (3,50€), a Mosaic Pale Ale (3,50€), a Rogue Halzelnut (5€) e a Mango Raspeberry Melba (4,50€). Nenhuma tem o mesmo sabor, nem idêntico. 

Mas nem só de cervejas vive o Capt.Tap. No espaço, os clientes podem provar waffle de batata-doce com queijo camembert (6,50€) ou com salmão (8€). Não é um waffle como vemos habitualmente — leva, na receita, cerveja, o que o torna menos seco, mais saboroso, mais recheado e suculento. O queijo e salmão dão o toque final. Há também mozzarella sticks (5€) ou nuggets de queijo (5,50€), além dos snacks de amendoins (0,50€) ou tremoços (1€) e os nachos com hummus (4€).

O espaço é dog friendly e até há uma taça de água à porta para que todos os patudos possam refrescar-se no final dos seus passeios. Siga a página de Instagram e de Facebook para saber todas as novidades deste spot, que fica na Baixa de Setúbal.

Percorra a galeria e conheça melhor todo o espaço Capt.Tap Beer Craft.

FICHA TÉCNICA

  • MORADA
    Rua António Maria Eusébio, 83
    2900-236 Setúbal
  • HORÁRIO
  • Quarta e quinta-feira, das 16h às 0h
  • Sexta-feira e sábado, das 16h à 1h
  • Domingo, das 13h às 20h
PREÇO MÉDIO
Menos de 10€
TIPO DE COMIDA
bar

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